Por António Saraiva, Business Development manager ISQ Academy

A propósito de um recente jogo de futebol entre Portugal e Hungria, um dos jogadores da selecção nacional justificou o empate caseiro com a frase: “entrámos no jogo deles!”. À primeira vista, a gestão de pessoas e o desporto de competição parecem mundos distintos. Um pertence ao universo corporativo, enquanto o outro se desenrola em estádios e pavilhões. No entanto, ambos partilham um terreno comum: o desafio de mobilizar talentos, gerir egos, manter o foco em objectivos ambiciosos e, acima de tudo, construir equipas de elevado desempenho.

“Entrar no jogo deles” vai além de uma simples metáfora. É reconhecer que o desporto competitivo pode ensinar muito à gestão de pessoas. Ao adoptar práticas inspiradas no treino desportivo – como liderança empática, cultura de equipa, foco na melhoria contínua e resiliência – as organizações podem transformar-se em verdadeiras equipas de alto desempenho. No fundo, seja no campo ou na empresa, o objetivo é o mesmo: vencer com propósito.

No desporto, o treinador desempenha um papel central. Ele não apenas define estratégias, mas conhece profundamente os seus atletas, sabendo quando exigir mais e quando protegê-los. O mesmo se aplica à liderança organizacional: líderes eficazes são aqueles que desenvolvem suas equipas, adaptam o estilo de comunicação e criam um ambiente no qual todos conhecem seus papéis e sentem que pertencem.

Equipas vencedoras não são compostas apenas por estrelas. Elas são formadas por jogadores que confiam uns nos outros e que reconhecem que o sucesso colectivo depende da contribuição individual. Nas empresas, promover uma cultura de colaboração, onde o reconhecimento é partilhado e os erros são encarados como oportunidades de aprendizagem, é essencial para uma performance sustentável.

No desporto, o treino é diário, o feedback é imediato e a melhoria é constante. Já nas organizações, muitas vezes o desenvolvimento é esporádico e o feedback é adiado. É importante estabelecer rotinas de aprendizagem, incentivar o coaching e encarar o erro como parte do processo de crescimento. Atletas de elite treinam não apenas o corpo, mas também a mente. A resiliência, a capacidade de lidar com a pressão e de se reerguer após uma derrota são competências críticas. No mundo corporativo, onde a mudança é constante e os desafios são imprevisíveis, cultivar uma mentalidade de crescimento e resiliência representa uma vantagem competitiva.

No desporto, tudo é medido: tempo, distância, eficácia. Nas empresas, a gestão de desempenho deve ser igualmente rigorosa, mas também humana. Definir objectivos claros, acompanhar resultados e celebrar vitórias (mesmo as pequenas) são práticas que motivam e alinham as equipas.

Mas será que a realidade organizacional é assim tão comparável? Pode ser… mas devemos ter cuidado! No desporto, o objetivo é claro: ganhar. Nas organizações, o sucesso é mais difuso — envolve bem-estar, sustentabilidade, ética e inclusão. Ao adoptar modelos de alta competição, não podemos correr o risco de valorizar apenas os “melhores”, de promover o burnout e de esquecer que as pessoas não são atletas profissionais. Ao focarmo-nos em métricas, rankings e objectivos ambiciosos, esquecemos dimensões fundamentais da gestão de pessoas: a atenção ao outro, a escuta e a construção de sentido. A gestão humanizada, que valoriza a singularidade de cada pessoa, é muitas vezes substituída por modelos de avaliação e recompensa que privilegiem o curto prazo.

“Entrar no jogo deles” nem sempre representa um erro — é uma aprendizagem! Trata-se de um jogo onde o sucesso também se mede pela qualidade das relações, pela confiança, pela aprendizagem contínua e pelo equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. A metáfora desportiva continuará a ser relevante, mas deve ser utilizada com consciência. A gestão de pessoas não é uma competição, é uma construção. E talvez o verdadeiro desafio seja criar organizações onde todos possam jogar, crescer e vencer, sem que isso implique perder-se pelo caminho.

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