A chegada de oxigênio na atmosfera da Terra marcou um momento decisivo na história do planeta, transformando-o em um mundo capaz de suportar vida complexa. Essa mudança significativa, conhecida como o Grande Evento de Oxidação (GOE), ocorreu aproximadamente de 2,1 a 2,4 bilhões de anos atrás. No entanto, a fotossíntese oxigênica — produzida por cianobactérias — provavelmente evoluiu centenas de milhões de anos antes desse evento. Apesar dessa capacidade inicial de gerar oxigênio, os níveis atmosféricos permaneceram baixos por um longo tempo. Os cientistas há muito debatem a causa desse atraso, considerando explicações como emissões vulcânicas, sumidouros químicos e interações biológicas. Porém, nenhum fator isolado explicou completamente por que levou tanto tempo para o oxigênio se acumular no ar da Terra.

Para abordar essa questão persistente, os pesquisadores focaram em um elemento frequentemente negligenciado da química da Terra primitiva: o papel de compostos traço como níquel e ureia no crescimento de cianobactérias.

O pesquisador principal Dr. Dilan M. Ratnayake do Instituto de Materiais Planetários, Universidade de Okayama, Japão (atualmente no Departamento de Geologia, Universidade de Peradeniya, Sri Lanka), explicou: “Gerar oxigênio seria um imenso desafio se algum dia quisermos colonizar outro planeta. Portanto, buscamos entender como um micro-organismo diminuto, as cianobactérias, foi capaz de alterar as condições da Terra para torná-las adequadas para a evolução de vida complexa, incluindo a nossa. As informações obtidas com este estudo também fornecerão uma nova estrutura para as estratégias de análise de amostras para futuras missões de retorno de amostras de Marte.”

Os professores Ryoji Tanaka e Eizo Nakamura do mesmo instituto também colaboraram no trabalho, que foi publicado na revista Communications Earth & Environment.

Recriando a Terra Primordial em Laboratório

A equipe realizou um estudo experimental em duas partes, projetado para imitar as condições da Terra Arqueana (aproximadamente 4 a 2,5 bilhões de anos atrás). No primeiro experimento, misturas de amônio, cianeto e compostos de ferro foram expostas à luz ultravioleta (UV-C), replicando a intensa radiação que provavelmente chegava à superfície da Terra antes da formação da camada de ozônio. Esses testes exploraram se a ureia — um importante composto nitrogenado para a vida — poderia ter se formado naturalmente sob tais condições.

Na segunda fase, culturas de cianobactérias (Synechococcus sp. PCC 7002) foram cultivadas sob períodos alternados de luz e escuridão, enquanto variavam as quantidades de níquel e ureia em seu ambiente. Os pesquisadores monitoraram o crescimento por meio da densidade óptica e dos níveis de clorofila-a para medir como esses fatores químicos afetaram a produtividade das cianobactérias.

Com base nos resultados, a equipe propôs um novo modelo explicando como o oxigênio se acumulou gradualmente na atmosfera. Durante o início do Arqueano, a abundância de níquel e ureia pode ter restringido as florações de cianobactérias, impedindo a liberação sustentada de oxigênio. Como observou Dr. Ratnayake, “O níquel tem uma relação complexa e fascinante com a ureia em relação à sua formação, bem como ao seu consumo biológico, enquanto a disponibilidade desses compostos em concentrações mais baixas pode levar à proliferação de cianobactérias.” Quando esses níveis eventualmente diminuíram, as cianobactérias conseguiram prosperar de forma mais persistente, impulsionando o aumento do oxigênio que culminou no GOE.

Lições para a Terra e Além

As implicações dessas descobertas vão muito além da compreensão da história antiga. “Se conseguirmos entender claramente os mecanismos para aumentar o conteúdo de oxigênio atmosférico, isso lançará luz sobre a detecção de biossinais em outros planetas,” disse Dr. Ratnayake. Ele continuou: “As descobertas demonstram que a interação entre compostos inorgânicos e orgânicos desempenhou papéis cruciais nas mudanças ambientais da Terra, aprofundando nossa compreensão da evolução do oxigênio da Terra e, portanto, da vida nela.”

Essas descobertas também podem informar futuras explorações planetárias, uma vez que elementos como níquel e ureia podem afetar o desenvolvimento de oxigênio e vida em outros mundos.

Ao demonstrar como a ureia poderia se formar naturalmente sob condições arqueanas e mostrar que ela atua tanto como um nutriente quanto como um inibidor, os pesquisadores revelaram como os equilíbrios químicos sutis moldaram a biosfera primitiva da Terra. Os resultados sugerem que, à medida que os níveis de níquel diminuíam e a ureia se estabilizava, as cianobactérias floresciam, liberando oxigênio em grandes quantidades. Essa mudança gradual transformou finalmente a Terra de um planeta sem vida em um capaz de sustentar ecossistemas complexos — um passo profundo na longa jornada do planeta em direção à habitabilidade.

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