Por Marco Neves, autor, palestrante, coach e formador, especialista em integrar ciência, desporto e tecnologia para potenciar liderança e equipas nas organizações.
Por que é pertinente abordar este tema agora?
Quantas empresas falam abertamente sobre menopausa? E quantas perdem talento por não o fazer?
No próximo sábado, 19 de Outubro, celebra-se o Dia Mundial da Menopausa — uma oportunidade para destacar um assunto que ainda é invisível em muitas organizações: o impacto da perimenopausa e da menopausa no ambiente de trabalho. Longe de ser uma mera questão de saúde individual, esta transição biológica influencia directamente a produtividade, a retenção de talento e a cultura organizacional.
Em Portugal, onde as mulheres constituintes cerca de 50% da força de trabalho activa, ignorar essa realidade implica uma perda de competitividade e compromete o bem-estar — tanto individual quanto corporativo.
O contexto português — presença significativa das mulheres
Portugal possui uma das taxas de emprego feminino mais elevadas da União Europeia: em 2023, 70,2% das mulheres entre 15 e 64 anos estavam empregadas, superando a média europeia (65,7%). Isso indica que uma parte considerável da nossa força de trabalho vive (ou viverá) a transição menopausal, impactando directamente as pessoas, as equipas e as organizações.
A realidade: o que sentem (e não revelam) as mulheres em Portugal
Dados [2] de um estudo apresentado em 2024–2025 revelam que:
- 63% das mulheres afirmam que a menopausa afecta negativamente o seu quotidiano.
- 73% reportam um impacto negativo na eficiência/produtividade.
- 77% nunca discutiram o tema com as suas chefias.
- 9% admitiram ter faltado ao trabalho devido a sintomas (com cansaço, ansiedade/depressão e desconforto físico entre as causas mais comuns).
Estes dados refletem um padrão mais amplo: a pesquisa sustentada pelo Médis/ Projecto Saúdes indica que quase metade das mulheres nesta fase experimenta mal-estar e considera o assunto como um tabu social — dificultando o pedido de ajuda e soluções.
Além disso, um estudo nacional da Wells destaca a desinformação e falta de preparação, com 81% das participantes a não distinguirem menopausa de perimenopausa e 73% sem qualquer tratamento específico — informações que evidenciam a necessidade de literacia e suporte.
Do tabu à política — o tema entra na agenda e nas empresas
Nos anos de 2024–2025, o assunto ganhou maior visibilidade. A documentação do Projecto Saúdes mostra que o tema chegou ao Parlamento (Comissão de Saúde) e foi mencionado nas discussões sobre o Orçamento do Estado — indícios de que há uma tração política e social.
No âmbito empresarial, surgem iniciativas inovadoras em Portugal, como a Team Lewis, que instituiu uma Política de Menopausa com medidas de diálogo aberto, ajustes de horários/teletrabalho e adaptações no ambiente físico (AVAC, ventoinhas, ergonomia), além de workshops e Programas de Assistência ao Colaborador.
Enquanto isso, mercados internacionais já calculam os custos. Estimativas mencionadas pela Bloomberg apontam para US$ 26,6 bilhões por ano nos EUA em custos associados à gestão de sintomas, incluindo perdas de produtividade — uma referência útil para CFOs.
O que as mulheres podem fazer já?
Embora as empresas desempenhem um papel crítico, existem estratégias que cada mulher pode implementar para aprimorar o seu bem-estar e enfrentar os sintomas no dia a dia:
- Respiração funcional — padrões de respiração lentos (6 ciclos por minuto) com expirações prolongadas melhoram a variabilidade da frequência cardíaca (HRV) e reduzem o stress. Técnicas como 4-7-8 e box breathing também se mostram eficazes.
- Monitorização da HRV — dispositivos de biofeedback permitem a avaliação do stress, recuperação, movimento e sono, ajudando a ajustar rotinas e identificar padrões que influenciam os sintomas.
- Higiene do sono e recuperação — estabelecer uma rotina de sono (iluminação baixa, evitar ecrãs antes de dormir, técnicas de respiração) é fundamental para reduzir a fadiga e melhorar o humor.
- Movimento e pausas ativas — pequenos alongamentos ou caminhadas breves ao longo do dia ajudam a regular a energia e aliviar a tensão física.
- Literacia e apoio clínico — buscar informações confiáveis e acompanhamento médico quando necessário é essencial para gerir os sintomas de forma segura e eficaz.
Nota: Estes recursos são complementares; a orientação médica é fundamental quando os sintomas se tornam persistentes ou intensos.
O que as organizações podem implementar já (sem rótulos, com impacto)
As empresas podem criar um ambiente onde a menopausa deixe de ser um tabu e torne-se parte da estratégia de bem-estar e inclusão. Esta secção baseia-se em boas práticas que enfatizam políticas, ajustes e programas de apoio como elementos-chave para promover ambientes saudáveis e inclusivos:
- Política de Menopausa: Documento simples que define princípios de apoio, confidencialidade e possíveis ajustes, integrado na estratégia de Diversidade, Equidade e Inclusão.
- Ajustes razoáveis: Flexibilidade de horários, a possibilidade de teletrabalho em períodos críticos e pequenas adaptações no ambiente físico (temperatura, ventilação, acesso à água).
- Programas de apoio: Inclusão do tema nos Programas de Assistência ao Colaborador (workshops de literacia em saúde e formação para líderes sobre como abordar o tema com empatia).
- Cultura e comunicação: Criar guias de conversa, normalizar o tema nos canais internos e assegurar patrocínio executivo para dar legitimidade e visibilidade à iniciativa.
- Programa de Coleta de Dados Fisiológicos: Para reforçar políticas de bem-estar, as organizações podem implementar um programa estruturado de monitoramento fisiológico através de wearables, coletando métricas como HRV, padrões de sono, níveis de stress e atividade física. Os dados agregados (mantendo a confidencialidade) podem ser analisados trimestralmente e integrados em dashboards de saúde corporativa, alinhando-se a iniciativas de Assistência ao Colaborador e de bem-estar. Este tipo de monitoramento, já recomendado por boas práticas internacionais, ajuda a medir o impacto real das ações e a promover uma cultura baseada em dados.
Medição e ROI — do indivíduo à organização
- Para as mulheres (autogestão e bem-estar)
- BOLT Score (Body Oxygen Level Test)
Um indicador simples da tolerância ao CO₂ e eficiência respiratória. Valores mais altos estão associados a uma melhor regulação autonómica e menor sensação de falta de ar. Pode ser monitorado semanalmente para avaliar o progresso com exercícios respiratórios. - Como calcular o BOLT Score:
- BOLT Score (Body Oxygen Level Test)
- Sente-se confortavelmente e respire normalmente pelo nariz.
- Após uma expiração suave, prenda a respiração e conte os segundos até sentir o primeiro desejo claro de inspirar.
- Retome a respiração pelo nariz.
- O número de segundos é o seu BOLT Score. Valores acima de 25 segundos indicam melhor tolerância ao CO2 e eficiência respiratória.
- Feedback de HRV (por meio de wearables)
Acompanhamento de métricas de HRV e índices de recuperação ajuda a identificar padrões de stress, sono e recuperação. Pequenas melhorias sinalizam maior resiliência fisiológica. - Benefício: Medições como estas permitem ajustar rotinas (sono, pausas, respiração) e fornecer feedback objetivo sobre estratégias de auto-regulação.
- Para as organizações (impacto e ROI)
- Absentismo e presentismo: monitorar faltas e autoavaliações de produtividade.
- Produtividade percebida: inquéritos trimestrais de pulso.
- Retenção de talento entre 45–60 anos: taxa de permanência e mobilidade interna.
- Utilização de programas de apoio: número de acessos e satisfação.
- Comprometimento e segurança psicológica: índices de clima e feedback qualitativo.
- Benchmark financeiro: estimar o custo evitado com base em absentismo e turnover (referência internacional: perdas anuais superiores a US$ 26,6 bilhões nos EUA).
Plano em 90 dias (exemplo)
- Dias 0–30: diagnóstico rápido (survey anônimo); capacitação de líderes; ajustes no ambiente; criação de um guia de conversa; coleta inicial de dados fisiológicos (wearables).
- Dias 31–60: piloto com política/ajustes em uma área; capacitação de embaixadores internos; início de workshops; monitorização contínua de dados fisiológicos.
- Dias 61–90: avaliação do piloto; ajustes nas políticas; integração em dashboards de Pessoas; plano de expansão; análise comparativa dos dados fisiológicos.
Por que agir agora? Uma oportunidade de liderança e inclusão
Líderes e empresas que encararem a menopausa como uma questão de equidade, segurança psicológica e produtividade sustentável e que integrem políticas de menopausa em suas estratégias de bem-estar e inclusão colherão benefícios tangíveis: retenção de talento sénior, redução de custos invisíveis e uma cultura onde todos podem prosperar.
Em Portugal, o tema deixou de ser invisível — cabe às lideranças fazer a transição do reconhecimento para a ação mensurável.
Fontes
[1] Eurostat/EURES — Taxa de emprego feminino 2023
[2] Grupo Ageas — Estudo sobre impacto da menopausa no trabalho
[3] Projeto Saúdes/Médis — Relatório nacional
[4] Wells — Estudo Menopausa em Portugal
[5] Projeto Saúdes — Documentação parlamentar
[6] Human Resources Portugal — Caso Team Lewis
[7] Bloomberg — Estimativa de custos EUA
[8] Oxygen Advantage — Técnicas respiratórias
[9] Firstbeat Life — Monitorização HRV
[10] OMS — Higiene do sono e movimento
[11] Direção-Geral da Saúde — Literacia e apoio clínico
[12] CIPD — Guidelines políticas de menopausa
[13] Great Place to Work — Boas práticas
[14] Oxygen Advantage — BOLT Score
[15] Firstbeat Life — HRV
