Atravessar o Atlântico nunca foi tão rápido, especialmente no que diz respeito à troca de dados. Nos últimos anos, as Regiões Autónomas passaram a depender muito menos dos cabos centenários que ligavam Lisboa às ilhas, tendo agora acesso a redes classificadas como “very-high-capacity” pela Comissão Europeia. Atualmente, quase todos os lares da Madeira e dos Açores possuem fibra.
A cobertura 5G alcança a maioria da população, e o céu adicionou uma nova dimensão de conectividade com os satélites de órbita baixa. Essa infraestrutura, antes invisível para o cidadão comum, tornou-se a essência de serviços como streaming em 4K, e‑sports, realidade virtual e, claro, plataformas de jogos online.
Da fibra ao satélite: a nova espinha dorsal digital das ilhas
Em 2024, a CEO da MEO destacou no Funchal que a Madeira possui uma das maiores coberturas de fibra óptica do país, revelando que o 5G está disponível para 85% dos residentes, até mesmo nos principais túneis rodoviários da via rápida. Um comunicado interno da operadora confirmou esses dados.
O arquipélago apresenta uma cobertura de fibra próxima de 95% e rede móvel 5G em todos os municípios. A fibra não é apenas abundante, mas também rápida. Dados da ANACOM indicam que, no primeiro trimestre de 2025, 85,2% das famílias portuguesas já tinham serviços fixos de alta velocidade.
Um quarto dos acessos atingia pelo menos 1 Gbps de download. A Madeira e os Açores estão acima da média nacional em termos de lares cablados, provando que o rótulo de periferia não se aplica mais ao Atlântico português. Essa situação abre diversas oportunidades, tanto comerciais quanto de entretenimento.
As plataformas de cassino demandam boas conexões para operar adequadamente, assim como o streaming de alta qualidade e gráficos avançados. Com os sites e redes de poker online, um jogador de Machico pode, em questão de segundos, competir contra adversários de Macau. A conectividade móvel apresenta resultados igualmente impressionantes.
O Portal 5G contabilizou 13.954 estações base ativas em todo o país no final de março de 2025, apresentando um crescimento anual de cerca de 40%. O regulador salienta que as antenas já cobrem todos os 308 municípios portugueses, e as duas regiões autónomas têm densidades de células que rivalizam com as áreas urbanas do continente.
A infraestrutura submarina também recebeu um impulso significativo. Em julho de 2025, a Google apresentou o cabo “Sol”, que possui 16 pares de fibra óptica e está ancorado em Lagoa, São Miguel. Este projeto, que complementa os cabos “Nuvem” e “EllaLink”, reduz a latência nas ligações transatlânticas.
Adicionalmente, os Açores se tornaram um nó redundante para serviços de cloud e inteligência artificial. Quando a orografia torna a instalação de fibra dispendiosa, a solução está no céu. Testes realizados em fevereiro de 2025 pelo Pplware com a antena Starlink de terceira geração apontaram pings entre 25 e 38 ms e velocidades de 340 a 409 Mbps em território português.
Cerca de um quarto das ligações fixas residenciais atingem ou superam 1 Gbps, permitindo assim videojogos competitivos e videochamadas em 4K até mesmo em freguesias que anteriormente dependiam de ADSL. No entanto, a conectividade transcende cabos e antenas. Tem impacto na economia local. O programa Digital Nomads Madeira atraiu 15.000 trabalhadores remotos de 136 países.
Dessa forma, injetou cerca de 1,5 milhões de euros mensais na economia regional, segundo dados da Secretaria da Economia. Cafés tornaram-se “hotspots híbridos”, aldeias como a Ponta do Sol requalificam espaços públicos com Wi-Fi municipal, e empresas de software podem optar por Santana ou Angra para albergar suas equipes distribuídas.
Prós e contras de um arquipélago sempre online
Como em qualquer cenário, a conectividade traz tanto benefícios quanto desafios. Contudo, as perspectivas sociais tendem a ser otimistas.
Prós
- Fortalecimento do mercado de trabalho qualificado e surgimento de novas carreiras tecnológicas
- Retenção de jovens talentos que antes emigravam para o continente
- Aumento das receitas fiscais devido aos impostos sobre jogos online
- Visibilidade global das tradições locais através de streaming e eventos virtuais
Contras
- Alta dependência de plataformas externas, sujeitas a mudanças de algoritmo e de tributação
- Aumento de quase 18% nos preços médios de arrendamento em freguesias com forte presença de coworking
- Um aumento de 3,1% no consumo elétrico regional, devido a servidores e infraestruturas 5G
- Possível exclusão de residentes com baixa literacia digital ou sem acesso a dispositivos modernos
O que falta ligar? Próximas apostas até 2030
A infraestrutura já é capaz de suportar vídeo em 8K e torneios globais de poker, mas o arquipélago ainda enfrenta o desafio de gerar praticamente toda a sua energia a partir de fontes solares, eólicas e hídricas. O projeto-piloto Insulae, lançado no Museu de Eletricidade do Funchal, aponta o caminho a seguir.
A iniciativa inclui carregamentos de veículos elétricos, em grande parte alimentados por energias renováveis, e uma meta de 55% de produção verde até 2030. Financiado com 69 milhões de euros do PRR, o programa prevê baterias de larga escala e a modernização das centrais hidroelétricas da Calheta e da Serra de Água.
Esses elementos são fundamentais para tornar a rede das ilhas mais resiliente a tempestades e picos de consumo. Enquanto a Madeira reforça seu mix energético, os Açores se firmam como um laboratório de dados do Atlântico.
O anexo do cabo Google Sol no verão de 2025 colocou São Miguel no mapa dos principais fluxos de tráfego. A expansão dos pontos de troca de tráfego (IXP) levou analistas a prever que os centros de dados poderão contribuir com até 26 bilhões de euros ao PIB português até 2030, quando o campus de Sines 4.0 estiver concluído.
A Colt, que já conecta 15 data centers no país e se prepara para oferecer trânsito IP de 400 Gbps em Lisboa, destaca que o novo POP Tier 1 diminui a latência e garante conexões robustas para todo o mundo, facilitando o alojamento de conteúdo para criadores madeirenses e açorianos. No entanto, mais velocidade não implica inclusão automática.
O perfil demográfico revela que 20% da população insular tem mais de 65 anos, e muitos ainda carecem de competências digitais básicas. O movimento “Eu Sou Digital”, em colaboração com a GNR, já capacitou cerca de 85.000 portugueses desde 2022, sendo considerado um bom modelo de literacia entre os seniores.
Oferecem-se workshops presenciais em juntas de freguesia, sessões porta-a-porta e conteúdos acessíveis em linguagem fácil. Um relatório de 2025 sobre responsabilidade social destaca essa iniciativa como um caso de teste eficaz na mitigação da nova iliteracia. Também a regulação precisará de se ajustar. O Imposto Especial de Jogo Online (IEJO) caiu 4% no primeiro trimestre de 2025, totalizando 82,7 milhões de euros.
Isso se deve a uma queda de 13% no volume de apostas desportivas, segundo dados do SRIJ. A diminuição reacendeu o debate sobre a necessidade de um modelo fiscal mais estável que não afugente operadores tecnológicos, mas que mantenha fundos para o desporto amador.
Conclusão
A Madeira e os Açores demonstraram que ser uma “ilha” não significa mais estar isolado. O desafio que se aproxima não será apenas pela largura de banda, mas sim pela capacidade de converter gigabits em prosperidade sustentável.
Produção de energia limpa para alimentar data centers, promoção da literacia digital para que todos acessem o palco global e um ambiente fiscal que equilibre inovação e responsabilidade social. Se o arquipélago jogar suas cartas corretamente, não somente estará conectado ao mundo, mas se tornará um ponto de ligação imprescindível.
